domingo, 12 de janeiro de 2014

Crónica de um disparo IV

                 Deviam vê-lo. De olhar sedento de sangue e glória,na sua ânsia de desconstruir a criança selvagem. Deviam vê-lo. De olhar sorridente e sedutor, na sua forma de despir de sociedade e pudores a sua presa. Atento caçador, de analítico olhar, que apenas com um relance medite e avaliaste a tua presa e indigna a consideraste. Apenas com um disparo, perspicaz caçador, acertaste em cheio no âmago da tímida verdade que a fera lutava para esconder em si e, mais que tudo, de si.

Deviam vê-lo, agora silencioso, à espera, fingindo não a ver. Devia vê-la, atentamente, apreciando e avaliando o estrago que fez.

Devia ver-se, ela, a fera. Devia obrigar-se a enfrentar o que o "predador" pôs a nu. Aquilo que tanto se esforçou por reprimir e ocultar de si mesma, criança selvagem; que o bravo caçador, na sua candura, franqueza e frieza, a forçou a encarar.

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